PALAVRAS POETIZADAS

Você não foi o que eu imaginei.

Na minha imaginação de jerico, vivenciaríamos o enrendo de uma comédia romântica com uma trilha sonora fantástica, mil sorrisos e uma química absurda. Talvez você tenha um pouco de culpa no cartório pela compatibilidade absurda que tivemos e sua atitude se assemelhar com a de um príncipe, praticamente numa carruagem, travestido de terno e um abdômen que faria inveja até em Apolo.

Eu consegui me equiparar a uma criança de treze anos pela criatividade digna dos filmes da Disney, por mais que meu discurso sempre começasse com “eu não vou criar expectativa”.

Droga de realidade.

Talvez, em qualquer uma das minhas outras vidas dentro dessa própria, eu jamais tivesse me sentindo tão viva. Com o meu sangue dançando em minhas veias e as borboletas sendo coreografadas pelo meu coração batucando ritmicamente algo rápido e intenso.

Me recomponho mas ainda resta um pouquinho dessa adrenalina percorrendo cada centímetro do meu corpo, sensação que não é substituída por nenhuma substância, lícita ou ilícita. Por mais piegas que isso possa soar, a melhor droga é o efeito que você proporciona em mim. Seja esse sentimento efêmero, ou não. Seja você efêmero, ou não.

Enquanto nada se ajeita e tudo parece estar sem desfecho, me afundo em Radiohead e prostração.

Cada vez que me desengano com algo, um tiquinho da minha alma vai se dissipando e meu coração, endurecendo. A lucidez que me ocorre com a filhadaputagem do mundo ser como é me deprime e não há nada que eu possa fazer. Opto pelo caminho menos doloroso e me isolo sem respostas para as milhões de perguntas de como agir em momentos como esse.

E na magnitude de ser uma zé ninguém, me enterro em incógnitas que não levam a nenhum final feliz.

Enquanto a água me molhava, desejei que ela pudesse levar embora o seu cheiro impregnado em mim… ou ao menos levasse tudo que eu imaginava estar grudado na superfície da minha pele.

Imaginei uma crosta de você correndo água abaixo. Levando, misturado com o sabão, as memórias, sensações, sorrisos e olhares. Todos tão sinceros e passageiros que mal pude ter tempo de agarrar – sequer usufruir – e já te vi indo embora. A água estava quente mas não me incomodava. O vapor parecia acalmar a tempestade de você explodindo em cada pedaço do meu corpo. Eu preciso de uma folga e ao menos esses banhos longuíssimos me fazem esquecer um pouco de tudo que a gente viveu. Por mais que ainda tenha um pouco de você em cada cômodo dessa casa. Por mais que ainda faça um silêncio miserável cada vez que saio do banho e não tem ninguém me esperando. O vazio do meu coração ecoa no apartamento, e tudo parece maior, mais escuro e solitário.

Te procuro em cada olhar trocado e tento te substituir em cada noite. Em cada conversa vazia ou opinião trocada. E me afundo em cada copo, que logo me vejo sem coordenação e perdendo a noção de onde eu piso. Tento te encontrar em cada aventura ao voltar para casa.  É difícil viver por mim, só por mim e toda essa responsabilidade que me ocorreu sem que eu quisesse.

São tantas pessoas vazias, caras vazios e conversas vazias. Me sinto ainda mais sozinha rodeada de gente, enquanto me travesto com um sorriso e me embriago em mais uma noite.

Mais uma noite sem você.