PALAVRAS POETIZADAS

Exílio

Enquanto a água me molhava, desejei que ela pudesse levar embora o seu cheiro impregnado em mim… ou ao menos levasse tudo que eu imaginava estar grudado na superfície da minha pele.

Imaginei uma crosta de você correndo água abaixo. Levando, misturado com o sabão, as memórias, sensações, sorrisos e olhares. Todos tão sinceros e passageiros que mal pude ter tempo de agarrar – sequer usufruir – e já te vi indo embora. A água estava quente mas não me incomodava. O vapor parecia acalmar a tempestade de você explodindo em cada pedaço do meu corpo. Eu preciso de uma folga e ao menos esses banhos longuíssimos me fazem esquecer um pouco de tudo que a gente viveu. Por mais que ainda tenha um pouco de você em cada cômodo dessa casa. Por mais que ainda faça um silêncio miserável cada vez que saio do banho e não tem ninguém me esperando. O vazio do meu coração ecoa no apartamento, e tudo parece maior, mais escuro e solitário.

Te procuro em cada olhar trocado e tento te substituir em cada noite. Em cada conversa vazia ou opinião trocada. E me afundo em cada copo, que logo me vejo sem coordenação e perdendo a noção de onde eu piso. Tento te encontrar em cada aventura ao voltar para casa.  É difícil viver por mim, só por mim e toda essa responsabilidade que me ocorreu sem que eu quisesse.

São tantas pessoas vazias, caras vazios e conversas vazias. Me sinto ainda mais sozinha rodeada de gente, enquanto me travesto com um sorriso e me embriago em mais uma noite.

Mais uma noite sem você.